You have to ask yourself what brought the person to this point

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Denota um comportamento narcisista...Isto é…adopta uma postura egoísta e egocêntrica ou chega a preocupar-se com os sentimentos e as necessidades do seu parceiro?

A loira levanta-se e vejo as nódoas negras que lhe tingem as pernas. Caminha na direcção da cama e sobe novamente para os lençóis da perdição recomeçando com as carícias de um animal insaciado e indistinto. A sua preferência pelo Figgy é claramente notável mas afinal acaba por não me aborrecer porque tudo o resto é chato e enfadonho e deixo de me vir com determinação. Os orgasmos após esses são tão ligeiros, tão indiferentes que saio do quarto com uma sensação que não se despega do corpo e a malícia sobe-me até ao peito enquanto atravesso a cozinha enegrecida e sinto o anseio novamente agitar-se mas a advertência impede-me de regressar ao quarto. Arrasto-me até à casa de banho, latejando e, enfraquecida, afundo-me no chuveiro de água quente onde o meu corpo se reflecte nos espelhos altos arrumados em minha frente. E é tão intenso e exagerado o suor que me escorre do corpo, que me inunda as mãos e as cavidades ósseas e mais resguardadas do físico – que já não me pertence – e que me implora para que o coma e, não sei se é a minha imaginação, mas o coração que pertence ao corpo ouve-se palpitar longe do mesmo, fora, ausente, domável, dominante. A energia regressa e sinto-me subitamente tão capaz, tão possuidora, com uma permanência que dura…para sempre. E tenho a certeza que é necessário tocar-lhe mas receio o toque, com tanta relutância que arrasto primeiro os dedos amenos pelos braços esguios e as pernas estremecem, num vibrar tão patente e veemente, que sinto que não serei capaz de o suportar, nem durante mais um segundo, mas a sensação é… para sempre… E finalmente vou tocando, primeiro muito docemente, com uma suavidade excitante, ahhhh, o peito pulsa e os mamilos esfregam-se pelas mãos e observo o corpo, o suor que persiste em correr. Não ligo a água, deixo-o escorrer e fundir-se com a evidência mais clara dessa excitação e subitamente experimento tudo, as memórias atacam-me e explodem dentro de mim, do corpo, fora, em todo o lado e conectam-se ao estado de tempo, à ausência espacial, à despersonalização do meu ser e os gemidos dos outros dois corpos menos capazes que se completam num vai e vem continuo do quarto do lado, mas tão estupidamente insignificante quando comparado a esta latência passiva que é tão mais orgásmica e finalmente toco lá, no grelo de onde as palpitações fluem e se propagam e eu venho-me… A água corre, o suor escorre, os orgasmos aniquilam-me e essa sensação.. bem essa sensação dura… para sempre.






Por Alicia, História de uma Garrafa de whisky (Conto 7: Suntory Yamazaki Single Malt Whisky)

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

The malt that sweetly whacks you.

-Um. Dois…
PAM.PAM.PAM.PAM. Acorde baixo. Entra o Charlie no contrabaixo. Tam tam tam taaammmm. James na bateria. Sete. Sete. Sete. Inspiro fundo. Levo-lhe os lábios. Aaaaarghhhh. Pam. Tam. Yeah. La. Ta. Pum. Pum-rrrrrrrrrrrrrrr.
-O Steve no sax.
Aplaudem. Uuuuuuuhhhhhh, ressoa na multidão que me observa. Chega, aproximo-me. Sete. Sete. Cerro os olhos. Arghhhhhhhh. Já não sei o que toco.
- O Steve no sax…
-Eu sei, ele é óptimo.
-Fantástico.
-Porra, que qualidade.
-Yeah.
As cabeças fluem ao som do batuque.
-É….é….
-Formidável.
-Porra, é formidável.
-Que qualidade.
-É Nova Iorque, Manhattan, Milão, Paris. Sabes?
-Já fomos a todo o lado, baby.
-Ui.
-És uma cadela querida.
-Ohhh, que modéstia.
-Hey!
Sete. Sete. Seis- Paaaaaaaammmmmmmm. Yeah. Tam. Tam. Tam. La la la la la ta ta ta ta ta.
-Munique, Bruxelas, Londres, Edimburgo. Argentina!
-Agora querem levá-los à Argentina.
-O quê?!
-Querida, és uma cadela.
-Oh, Steve…
-Diz, querida.
-Sete. Sete.
-Formidável.
-Steve no sax.
-Que qualidade.
Apaixono-me pelas notas. Os batuques. As cabeças.
-Sim, eu sei, fui mazinha.
-Mazinha? Foste uma cadela.
Rimos.
-Tens a sensibilidade de um artista.
-Whaaaat?
-Não tenho sensibilidade, baby, sou um filho da puta.
-Faz de mim tua.
-Minha quê?
-Puta.
Ohhhhhhhhhhhh.
-yeah.
-Charlie no contrabaixo!
Aplaudem. Um ressoar uníssono de palmas.
-James na bateria!
Da próxima vez trago o piano. Uhhhhhh. Tam Tam pa pa pa pa pa pa. Fervem-me os olhos, enlaivam-se-me os lábios.
-Não devias estar seco, meu?
-Hum? Hum?
Pam pam pam pam pam.
-E Steve no sax!
Uuuuuhhhhhhhhhhhhhhhhhh. Cessa. Abro os olhos. Especulam-me de lábios sorridentes. Desço do palco e escolho uma morena de pernas altas que levo para dar uma volta comigo aos bastidores.
-Vou mostrar-lhe o backstage. Onde se ensaia.
-Ahahahahahahahaha.
-Steeveeeeee – geme ela quando lhe aprumo o vestido.
-Tens razão, nem é preciso, ele já é curto.
-Ahah, Steeveee – só que repentinamente se torna num – Oh, Steve, Steve, Steve, Steve….aahhhh.
-Despe-te.
-O quê?
-Despe-te – Ela despe. O vestido e tudo.
-STEVE! STEVE! STEVE!
-Tenho de voltar, querida. – Mexo-lhe nas mamas com as mãos.
-Oh, não, não. Fiiiicaaaa.
-STEVE! STEVE! STEVE!
-Eu fico, eu fico.
-STEVE!STEVE!STEVE!
-Ficaaaaa.
-Eu fico.
-STEVE! STEVE! STEVE!!!!
-Preciso de ir. Adeus, querida.
-Nãooo. – faz beicinho. Chupo-lhe o lábio.
-STEVE! STEVE! STEVE!
-Então, pá? Steve, pá! Anda lá!
-Preciso de ir, baby.
-Porquê? Porque é que não ficas comigo?
-Sossega… eu volto.
Corro a apanhar o sax.
-Ah… Steve…
-Hm-hm!
-És lindo a tocar o sax.
Chupo-lhe o lábio.
-Eu sei. – e regresso.


História de uma Garrafa de Whisky (conto 6: Ardberg)

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

bum!bum!bum!

É tudo um resumo de dados mundanos e indispensáveis. E eu estou tão agarrada a esta casa por tua causa. Há tanta história ingressada nas paredes. Encho-me de emoção quando percorro as suas divisórias, enquanto te escrevo isto, enquanto me masturbo na sequência das frases que mais entenderás. Faço-o mesmo. O meu cheiro irá envolto no papel e eu quero que escrevas sobre isso. Quero que me escrevas o corpo outra vez e que comas as palavras. Que te posiciones bem no centro do mundo e que o agarres com as mãos cheias. Que adores o sitio onde vives. Que ultrapasses a dicotomia racional e impulsiva. É tudo uma treta desmesurada. Não há dicotomias. Não há palavras, nem sentidos, nem conotações. Éramos animais a alimentar os nossos instintos com recursos fortes. Esgotou-se. Não compreendo o que se terá esgotado mas conjecturo a penúria dele. É que agora sobraram-me as rotinas vazias no consultório da Drª e ela não compreende nada do que eu digo. Eu e ela somos dois animais a latir face um ao outro, em vagidos divergentes. Nós ladrávamos da mesma forma, se é que me entendes. Nós éramos pura zoologia.


Vagueio pelas ruas desta cidade vazia e exibicionista e encontro os teus vestígios nas casas que passo. As palavras fogem-me da boca e o monólogo é tão insofismável e cansativo. Cuspo tudo com uma crueldade e uma certeza monótona e a cidade gira em meu redor, espalha-se nesse bolço que se brande no espaço infalível do ar e explode-me tudo diante da cara, as lágrimas rompem-me até aos dedos e não as aparo, não aparo nada; o ar sente-se bombástico nos pulmões, a correr-me nas veias, a rebentar-me os neurónios lentamente, com um aprazimento de maluco; É um clímax do ambiente e eu persisto em falar, as palavras continuam a ser respiradas e alimentadas e tudo se sustem no centro de mim, um ponto que eu custo a deparar no corpo porque está tudo a borbulhar tão freneticamente, num batuque tão insuportável e eu imploro para que cesse mas ao fim de algum tempo já só sei o que significa desarticular o mundo que me corrompe e me esvazia e tudo o que outrora se acumulava e me emocionava está agora disperso no espaço ornado em minha volta e os teus indícios também estão lá porque sei que fizeste exactamente o mesmo e agora estamos configurados neste funcionamento mecânico do mundo com um sentido de inconsciência tremendamente deslumbrante e continuo a cuspir palavras com uma veemência interminável e sinto o clímax aproximar-me novamente, desta vez fatal, os olhos reviram-se e o panorama é já tão embusteado, "está tudo na sua cabeça, está tudo na sua cabeça, concentre-se na realidade perceptível, o resto é ficção" o resto é ficção, ficção, ficção, sinto que posso alterar tudo com o escrevinhar de três ou quatro dialectos, já nem me sinto fundir com nada, flui-me tudo pela língua, pelos olhos, pelo simples acto de respirar, as palavras cavam-se da boca – bum!bum!bum! – mantêm-me acordada toda a noite, a vaguear num espaço interminável de incompatibilidade onde os nossos caracteres não se cruzam e não se encaixam e não fazem sentido e são ridiculamente dispersos pelas outras evidencias da autoria de alguém que não está a fluir em mim e sinto a tesão subir-me pelas pernas e pelo sexo, até aos braços, até aos dedos, até aos olhos, pelo ar que respiro, exalado depois nas palavras que profiro e já não sei como metabolizá-lo e ele é directamente exalado pelos meus poros e o suor escorre-me do corpo e inunda-me o sangue e as orelhas e sinto novamente o esgar da boca formar-se e tento apará-lo, concentrar-me, controlar-me, deixá-lo permanecer cerrado mas ele cospe-se sozinho e – bum! Bum! Bum! – sai tudo outra vez, para o ar, dissipa-se e volta, arghhhhhhhh, outro esgar repentino e muito descomedido, repleto de autenticidade, de inépcia, de inexorabilidade e já me dói falar, o maxilar move-se já lentamente, com um padecimento duro e seco, com uma articulação velha e oxidada que em muito me recorda a tua escrita profissional e atordoante, que irreversivelmente se funde nesta eclosão dos factores que pingam já no chão, esquentados por uma energia insondável e vai-se tudo cogitando na minha traqueia, vai-se tudo evaporando do meu ser, vai-se tudo contaminando no ar, vai-se tudo…. Arghhh… bang! – saem num esgar imparável de comprido infindável e peço que me silencies. Por favor, silencia-me porque começa tudo a sentir-se demasiado.

de História de uma Garrafa de Whisky, conto: Ballantines

terça-feira, 27 de abril de 2010

Ele atende uma mulher estrangeira. Ele procura sempre atendê-las, relacionar-se assim com desconhecidas completa-o, de certa forma.

O ano 2000

quarta-feira, 14 de abril de 2010

O pé da Lolita

O pai observa-a pela faixa de luz da porta do quarto, com os olhos consumidos por tal visão. Vê o modo como o verniz se apodera da unha total e a torna vermelha, exactamente da cor com que os seus lábios são pintados mais tarde. Ele sabe que ela não se apercebeu da sua presença e delira pelo facto de estar ali, sem ter de estar ali. O seu robe de cetim laranja e creme roça-lhe na coxa de pele macia e a luz incide sobre as madeixas loiras do seu cabelo grisalho. Os olhos também parecem luminosos, mais verdes, mais apaixonados. Mas é nesse pé, é nesse pé que se centra toda a beleza. Nesse pé em que o vermelho se apodera das unhas, nesse pé que subindo dá origem a uma perna, de musculo firme e a pele suavemente bronzeada. Nem ele sabe se tem a ver com o vermelho do verniz, ou se se trata da forma gentil do pé, mas algo o seduz imensamente. "Nesse pé de princesa onde tu pintas, o vermelho nas unhas, e a tristeza" Ele sente a tentação proveniente da imagem que observa minuciosamente e afasta-se da porta do quarto e dos perfumes doces que daí emanam. Avança até ao bar da casa e serve um whisky com gelo, acende um cigarro e abre as duas portadas da varanda. As lufadas de ar fresco entram e elucidam-lhe a cabeça. Têm consciência de estar mais calmo, menos viciado nos pés de menina que ela ainda é, no cheiro do seu perfume doce, na forma perfeita e rigorosa dos seus pequenos pés. "Saio p'rà rua a respirar os ácidos, perfumes e solto-me, mesquinho, já de ti!" Bebe do whisky e fuma o cigarro quando um ruído forte o faz voltar a cabeça. É quando a vê, unicamente de roupão, com o cabelo loiro e as unhas vermelhas a secar. Passa pelo corredor e sorri-lhe envergonhadamente, dirigindo-se de seguida à cozinha para preparar um chá de frutos vermelhos. Novamente imagens fortes lhe invadem a mente, imagens dela, nesse mesmo roupão, com certas partes do corpo a descoberto, com as maçãs do rosto rosáceas, o olhar inebriado nessa manhã de calor. Depois, o cheiro do verniz a secar apodera-se do salão e ele delira. Vê-se forçado a fechar os olhos e inspirá-lo com exacta precisão. Quando os abre, depara-se com ela especada, bem à sua frente, com os olhos postos no seu ar de infame prazer. A sua pequena boca aberta num círculo fecha-se rapidamente e mantém uma expressão rígida e tentadora, como apenas ela sabe fazer. Avança entre ziguezagues para o pai apaixonado e estende-lhe o pé de unhas pintadas ainda frescas aguardando prova de tal desejo. O pai fita-a e endoidece. Num impulso exagerado, coloca-se de joelhos e beija-lhe o pé, apaixonado. O cheiro da sua pele macia e doce invade-lhe os orgãos, torna-se a única coisa que ele poderá cheirar durante dias. Depois, apercebendo-se do quanto ferozmente lhe agarra e beija o pé larga-o, de repente. As marcas dos dedos vão-se evaporando com o tempo. Fitam-se durante momentos. A filha afasta-se e vira-lhe as costas. O pé tem ainda as marcas dos dedos do pai, o robe abana com o vento que entra da janela. Um desejo cresce dentro do pai. "Nesse pé de princesa que eu beijei." Acabou-se. Deixa-se cair para o sofá e pensa no que acabou de cometer. Incesto.  Sente a vontade incontrolável de chorar e beber mais whisky. Viverá para sempre sozinho neste salão, para todo o sempre, com perfumes doces a passaram constantemente ao seu lado, com o cheiro dos frutos vermelhos ainda quentes, com o verniz a secar. E, novamente, com a memória de um outro beijo no pé, nunca ultrapassariam tal acção. "E nas cinzas, o desejo sabe arder. Nesse pé de princesa das Astúrias, crescem às vezes acordes de samba." Era assim, amor deste, entre pai e filha, amor de beijar o pé, amor de amar o pé.


Nesse pé..., 2008, intercalado com excertos do livro A Noiva das Astúrias de Eduardo Guerra Carneiro

domingo, 7 de março de 2010

Need a Doctor?

Mas a droga devia ser demasiado pura porque não me recordo de quando me puxou para outra sala, onde me arrancou as roupas e me encheu de whisky e linhas, bebendo-o e cheirando-as num frenesim louco. Arrancou-me a blusa do corpo e puxou-me as calças com tamanha força que os seus dedos brutos ficaram vincados nas minhas coxas e abdominais. Depois abriu-me as pernas e mordeu-me as virilhas enquanto deitava coca por cima do meu clítoris e o lambia desvairadamente. No peito, em cima dos mamilos, deitou a quantidade de whisky que achou possível derramar e lambeu-o tão bem que quando regressei a casa o cheiro da sua boca estava espalhado por todo o corpo assim como as marcas de dentadas de tonalidade vermelha que frisavam o rosa salmão dos meus mamilos. Certas zonas do meu corpo, desgastou-as tanto que o sangue escorria em grandes camadas, inundando a superfície dura onde o meu rabo estava assente. Poderia ter durado horas e horas, porque a moca era tão grande e a dor tão aguda que entrava em orgasmos repetidamente. O Doutor sempre foi extremamente profissional e eficiente com os seus pacientes. Depois de me ter lambido e consumido pediu-me delicadamente que me virasse de costas para que prosseguisse com a inspecção física. Afastou-me as nádegas e introduziu dois dedos no recto enquanto me lambia languidamente o ouvido e me dava leves mordidelas pela coluna. Certa parte do ombro arrancou-ma com os dentes e trincou-a até a engolir, vindo-se quase simultaneamente ao meu lado. Agitou-me pelos ombros, sentou-me na cadeira e piscou-me o olho, de onde escorriam espessas lágrimas que fluíam com o sangue que jorrava da boca.


-Continuas perfeita, querida. Irrepreensível. Nunca me apareceu ninguém como tu, é bastante interessante. Estás óptima. E vamos manter o tratamento, pelo menos durante mais alguns meses. Volta daqui a relativamente pouco tempo para eu poder observar tudo novamente e garantir que não surgiu nenhuma complicação maior.

-Obrigada, Doutor. – respondi bastante austera ao que ele sorriu.

-Tens aqui a medicação, não te vou passar receita desta vez. – diz, entregando-me um pequeno saco transparente cheio de pó branco. – alguma dúvida telefonas-me.

Olho para ele uma vez mais e levanto-me, deixando o corpo descair numa dor forte. Avanço até à porta mas a sua voz faz-me parar, volto-me para trás.

-Oh, e Alicia – diz, enquanto observa as folhas pousadas na secretária à sua frente, voltando novamente o olhar frio para mim. – Pede um chupa-chupa na saída, sabes que eu preocupo-me sempre com os meus pacientes especiais.


 
Por Alicia em As duas invenções do pornógrafo Loy - 2010

sexta-feira, 5 de março de 2010

All tomorrow dinners

-Bem, acho que vou buscar o gelado. – diz a Ana.
-Ana estás muito bem. - diz o Johnny focando o olhar sério e doente na silhueta da Ana.
-Desculpa?
-Sim, caralho... Não te faças de desentendida... Estás boa!
-Hum, bem obrigada, Johnny.
-Oh, qual obrigada qual quê. Ainda andas com o larilas do Darwin?
-Larilas?
-Sim pá, toda a gente sabe.
-Toda a gente sabe do quê?
-Toda a gente sabe do que se passou!
-Do que se passou? - a Ana parece mesmo não estar a pescar nada do que ele diz. - Estás a falar do quê, Johnny?
-Oh, foda-se. Tu sabes!
-Não, não sei!
-Que o papá dele lhe foi ao cuzinho. – A Ana olha ferozmente para o Ruben que abana a cabeça negativamente. Parece que não foi ele.
-Isso não é verdade. - desculpa ela.
-Caralho, Ana. CLARO QUE É VERDADE. Não me digas que nunca te apercebestes. As camisas aos quadrados, o sotaque…
-Ele é holandês…
-Merda pá, o que é que isso tem a ver? O que eu acho é que não devias perder tempo com esse gajo. Podes ter qualquer rapaz que queiras.
-Vê lá se não a queres violar ali no quarto de cima. – diz a Trevo num tom de voz infantilizado e irritante. A Ana abre os olhos perplexa. Eu estou a mijar-me a rir, mas continuo a esforçar-me para não o demonstrar. Caralho, que jantar!
-E que tal se te metesses na tua vidinha…– berra ele.
-Bem, eu vou buscar o gelado… - diz a Ana novamente.
-Então e tu Patrícia? Ainda não te ouvi dizer nada esta noite. Deves estar enfrascadíssima em whisky. – a Ana levanta uma sobrancelha. Esta conversa está a ser interessante para todos.
-Eu?
-Sim, pá. Quem é que é o tipo que andas a papar agora?
-Bem, não tenho um relacionamento estabelecido agora. – Estabelecido não consta no dicionário de bolso dele. – Não ando a papar ninguém agora.
-Ah! Gostas de foder uns e outros, não?
-Sim, exactamente isso! – diz o Daddy. Filho da puta.
-É, eu também não tenho nada sério agora. – A Trevo levanta os olhos e fita-o desesperadamente. O namorodo deles acabou de ser rebaixado à condição de "nada sério" em frente a um grupo de agarrados. Acho que se começa a aperceber do que é que aquela maça cinzenta cerebral é feita. – Um gajo precisa de se abrir de vez em quando.
-Então e à bocado acabaste por conseguir dormir alguma coisa de jeito? – pergunta-me finalmente o Jimmy. -Epá não. A Ana resolveu despachar uma garrafa de vodka e foder-me os cornos. – As atenções centram-se na Ana que me abre os olhos ofendida. Estou-me a cagar, vou prosseguir. – Oh, mas eu já estou habituada. Quando não me esgravata a porta põe-se com aquela merda barulhenta no quarto.
-Que merda barulhenta? – pergunta o Daddy, desejoso de ter qualquer assunto de que ele ainda não se tenha apercebido que possa usar como arma numa guerra caseira.
-Aquele vibrador rabbit. É a noite toda zá-zá-zá-zá-zá-zá-zá-zá-zá-zá… depois vem o pá-pá-pá-pá-pá-pá-pá-pá-pá-pá-pá…tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá…zum-zum-zum-zum-zum-zum-zum-zum-zum. – Estão todos atentos aos meus lábios. Estou a ser emotiva, tenho a certeza. A Ana parece que vai chorar. – Mas o pior é quando passa horas no zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz. Até que tenho de gritar: “foda-se Ana!”. Epá é que quer dizer, uma gaja precisa de dormir. Aquela merda fode os cornos a qualquer um. – acho que vou ficar sem almoço durante uma semana.
-Oh Patrícia, caralho. –diz ela. Se calhar entusiasmei-me com o rumo da conversa.
-Oh Ru. Não te sintas envergonhada. Aqui o Johnny gosta de saber destas histórias. Tamos em família, caralho! Não te ponhas com timidezes. – ela baixa os olhos e contorce os lábios, numa daquela: “Pois. Parece que assim é.” – Até porque eu não fico a pensar que és uma puta ou assim, hum? Não me interpretes mal. Eu acho até bastante curtido essas cenas. – O Daddy tem um brilho diabólico nos olhos. O whisky leva-me sempre ao fundo das questões. A mesa mantém-se em silêncio agora.
-Então pá Johnny! – diz o Jimmy entusiasmado – no outro dia vi aí um vídeo teu com uma garina qualquer. Qual delas é que era? – diz com um riso idiota e tipicamente masculino. – Sem ofensa, querida. – dirigindo-se à Trevo, que acena tranquilamente.
-Ah! Era esta! Aqui a minha favorita! – e nisto agarra-a pelos ombros e dá-lhe um grande beijo na boca. Estamos sem palavras.
-Então quer dizer que já está tudo bem? – pergunto eu, sem pensar.
-O QUÊ? – pergunta a Tré assanhada e sem perceber patavina desta merda. O Johnny olha para a Ana, a Ana olha para mim, foda-se está duplamente zangada; o Daddy olha para o Jimmy e o Jimmy olha para o Daddy. Depois olham todos para mim, que coro cada vez mais enquanto encolho os ombros e imploro por misericórdia. Olham todos menos o Johnny que foca a Ana com um ar zangado e neurótico.
-Do que é que ela está a falar? - pergunta a Tré com um sorriso nos lábios. Rezo para que esse sorriso não desapareça. Bebo um grande gole de vinho. Ela continua na espectativa. Bebo o resto do copo.
-Johnny? Johnny? JOHNNY? - a inquietação dentro da Tré é visivel a todos nós. Puxa-lhe a manga do casaco freneticamente.
– DO QUE É QUE ELA ESTÁ A FALAR, JOHNNY?
Estou tão lixada que nem me apetece pensar nisso. Voltam todos a olhar para os pratos e o Johnny resmunga baixinho enquanto fita a Ana – Sua puta, sua puta.
-Bem, acho que vou buscar o gelado. – mas continua sem se levantar.
-Johnny! Do que é que ela está a falar? – a voz da Tré é decididamente estridente e irritadora. Deixei de ter pena dela.
-Foda-se, caralho! Mete-te na merda da tua vida. – Todos mantém um olhar de enterro. Mas que casualidade, ouvir o Johnny falar assim com a maior parte das suas namoradas.
-Mas Johnny! – grita ela.
-FODA-SE! JÁ TE MANDEI CALAR. – olha tudo para baixo.
-Estou grávida, Johnny. – Olha tudo para ela. Sem dúvida que estes jantares são para repetir.
-O quê? – diz ele, perplexo.
-Estou grávida. – e nisto começa a soluçar. – Com licença. – e levanta-se da mesa mais vermelha que um tomate. Todos se mantém calados.
-Bem eu acho que vou buscar o gelado. – diz a Ana uma vez mais.
-Eu vou buscar a merda do gelado. – digo eu já irritada com essa deixa.


Por Patrícia em Nevermind (Cap. Ninguém te vai dar tau-tau) 2008

The Moon Shines bright old

 Acordo com o bater dos dedos suaves na porta. Estão quarenta grau e o meu corpo está molhado na sua própria transpiração. Há algo de relevante no modo como a janela se mantém aberta. Levanto-me e sinto as primeiras náuseas da ressaca apesar de ainda sentir o desconcerto do alcool. Volto a ouvir as leves pancadas na porta mas é demasiado cedo para alguém importante. Levanto-me e sinto a dor de cabeça que se avizinha e nao há nada que eu consiga fazer em relação a isso. Encho outro copo de Jack Daniels e sento-me à beira da cama. Fui um homem de sucesso outrora, tinha tudo. Sabia fazer tudo, era o melhor fazê-lo, mas algo ocorreu. Algo que não consigo indicar, definir, particularizar. O copo está totalmente cheio e mantem-se fixo nas minhas maos. Sinto na lingua o sabor doce e quente do whisky. Recordo-me de algo ocorrido na noite passada e ia jurar que vi a Sienna, à entrada do hotel sozinha. Os cabelos loiros agarrados à cabeça por um elástico e as suas feições intensas e calorosas. Recordo-me de como falava e procurava desesperadamente intrometer-se na minha vida, ou pelo menos de como o tentava fazer. Quebrar a barreira entre nós, nunca foi um passo acertado."É a lua, não é?" perguntou-me. Longas e quentes lágrimas rompem repentinamente e o copo fica vazio, bem como a garrafa, e só consigo ver a noite, tão postuma perante mim. E disse: "Sim, é a lua."


Por Paul Hudson em Jack Daniels

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Jack, Let's Make Love

Estou com uma paciência de merda. Aliás, estou sem a mínima paciência. Acabei por dormir menos de meia hora porque a Ana se lembrou de raspar as unhas na porta do meu quarto como se fosse um gato ou o caralho. Não tenho paciência para essas merdas. Ainda tentei enterrar a cabeça na almofada mas depois de alguns minutos a tentar apercebi-me que não ia aguentar assim tanto tempo. É que, infelizmente, ainda só respiro pelo nariz e a boca. Bom, a situação encontra-se no ponto em que tenho de me por minimamente apresentável, tenho de ajudar a por a mesa, tarefa que habitualmente me cabe, mas que hoje não me apetece fazer e tenho de receber amavelmente o cabrão do Johnny e a puta da namorada dele. É deprimente, as coisas difíceis que uma gaja se vê forçada a fazer. Para melhorar esta situação da treta acabei de ouvir a porta e deve ser o Daddy, pela maneira como a fez bater, o dia deve-lhe ter corrido uma merda e eu, sinceramente, não tenho o caralho a ver com isso. O problema é que para o Daddy isso pouca importa.

-Boa noite. – não me apetece conversas chatas. – Boa noite! – se ele me obrigar a abrir a boca temos um caso muito fodido entre mãos – BOA NOITE! .....MAS QUE MERDA É QUE EU TE FIZ AGORA? – a verdade é que não fizeste nada, mas não tenho paciência para ti e tenho a leve sensação que ainda irás fazer.

-Hoje o Johnny e a nova namorada dele vem cá jantar – diz a Ana, que pelos vistos recuperou rápido da proeza de há algumas horas. Estou impressionada! O que é que a tipa fez?! Os olhos dela estão incrivelmente lúcidos.

-Hoje? – partilhamos desta satisfação interior.

-Opá Daddy não te ponhas com merdas agora. Sabes bem que o tipo vai trazer um porradão de cocaína e nós não queremos merda com o Johnny pois não?

-O Johnny que se vá foder. Eu quero é que ele e as putas das namoradinhas dele morram.

-Não sejas estúpido. Se não estivéssemos aqui a falar do Johnny eu até acreditava nessa treta. – O Ruben é capaz de ser um filho da puta ainda maior que o Johnny por isso não me admirava nada que realmente o quisesse morto. Este gajo até a mamã devia querer exterminar.

-Daddy, trata das coisas com a Patrícia, eu vou dormir um bocado porque estou com uma dor de cabeça horrível.

-Eu? Mas eu por acaso convidei alguns cabrões para virem cá jantar? Por mim esses tipos nem punham os pés cá em casa!

-Pois mas parecem que vão, portanto não faças merda! – e nisto bate com a porta. Provavelmente alguém vai jantar com um olho negro… e não sou eu.

-Mas o que é que lhe deu? –não lhe vou responder, estou a achar um piadão em embirrar um bocado com o fulano. – Foda-se, mas tu estás a ouvir o que eu te estou a dizer? Qual é que é a merda do teu problema? – se não estivesse a fingir de zangada desmanchava-me já a rir. Mas tenho uma imagem a manter. – RESPONDE-ME. –talvez sempre serei eu a ir jantar de olho negro. Isto se ele até estiver bem disposto. – EPÁ! CAMBADA DE ANORMAIS – e bate com a porta. Parece que resto eu e tu. Jack. Meu homem.


Por Patrícia em Nevermind (Cap. Rapariga procura garrafa de whisky para relacionamento sério) 2008

"Oh Christ" said the boy..."That year was something else!"

11 de Maio de 2000


Ela acorda, dói-lhe o estômago. Pensa na noite passada, sorri. Sente as pernas cansadas, o peito dormente, sente o cheiro dele por todo o corpo, mergulha no odor. Olha-se ao espelho, vê o rímel e o risco dos olhos a escorrer pela face. Arde-lhe a perna, observa, vê arranhões. Bastantes arranhões. Desce, come um iogurte, lava a cara, lava os dentes, arruma a mala. Põe os óculos e saí de casa.
Ele acorda. Tem o soutien ao pé, dói-lhe a cabeça. Dormiu poucas horas, tem de abrir a loja. Sente leves dores nas pernas e nos braços. Lava a cara, lava os dentes. Limpa a loja. Olha para o sofá e sorri. Guarda a roupa dela no quarto. Abre a loja.

Ela caminha, observa o sol, forte. Sente-o no estomâgo, na cabeça, na boca. Sente-se tonta. Continua a caminhar, chega à loja. Está aberta. Entra, não o vê. Espera. Ele aparece, ela sorri. É beijada. Ela pede a roupa. Ele diz que não dá. Ela sorri, beija-o. Combinam qualquer coisa e ela avança para a praia.
Ele atende três idosas, dá-lhes informações sobre fatos-de-banho vermelhos, elas estão atentas. Ele vai à arrecadação. Quando volta, encontra-a. Ela espera, com umas calças vermelhas e um biquini verde. Ele sorri. Beija-a. Ouve-a pedir a roupa. Diz que não pode, precisa dela, mais algum tempo. Vê-a sorrir e beija-a. Ela vai embora.

Ela chega à praia, as mesmas caras, as mesmas pessoas. Sente-se triste. Vai até ao mar, mergulha. Lava os restos de maquilhagem, de suor, do cheiro dele. Volta para a toalha, deita-se, pensa na noite passada. Começa a ser questionada sobre os arranhões, mente, sorri. Tem fome, vai para casa.

Ele não quer que ela vá, quer outra noite como a de ontem. Lamenta. Vê-a afastar-se. Continua a trabalhar. Começa a ter fome, vai almoçar. Volta para a loja e trabalha.

Ela chega a casa, sente-se cansada. Almoça e deita-se, acaba por adormecer. Sonha, sonha com alguma coisa. Acorda, já é tarde, ele ainda não disse nada. Caminha pela casa, sente o estomâgo dorido, sente a cabeça cansada e latejante. Pega na mala e saí.

Ele não vê hora para acabar o trabalho, quer ligar-lhe. Espera pelo amigo, está quase.

Ela vai a todos os cafés, quer um Redbull. Não há. Encontra um café que tem. Compra, caminha até à loja e bebe. Vê-o, fala com o amigo. Sorri. Ele olha para ela e sorri-lhe.

Chegou, ele não está sozinho. Agora pode sair com ela. Fala com ele, conta-lhe alguns pormenores da noite passada, eles riem alto, ambos. Ele vê-a chegar, sorri. Fala-lhe, diz-lhe para irem à praia.

Ela chega, fala-lhes. É convidada a ir à praia, aceita. Eles vão. Sentam-se, ele bebe um café, ela observa. Acabam, vão até à praia.

Começam por se dirigir ao café, a ideia é dele. Ele bebe, ela não. Ele fala, ela ouve. Vão até à praia.

Ela tem calor, corre para a água, despe as calças, mergulha, refresca-se, suspira. Corre para perto dele, que se encontra na areia, deitado. Deita-se ao seu lado. Ele olha-a. Ela sorri. Fecha os olhos. Encosta-se a ele. Não falam durante algum tempo. Deliram, imaginam e inventam coisas que sabem que nunca farão. Ela gosta tanto. Não consegue abrir os olhos. Ele abraça-a, ela sente-se confortável.

Ele está bem, ela tem calor. Ele não quer ir á agua, ela vai. Ele fica a observá-la. A sua sensualidade, no corpo, nas mãos, na cara. Quer que ela se deite. Sente-a molhada, beija-a. Ela fecha os olhos, ele senta-a encostar-se. Não falam. Ele parece gostar. Sente-a apertar. Aperta-a também.

Ela abre os olhos, vê os dele, tão perto. Sorri, beija-o. Sente as mãos dele pelo corpo, ela gosta. Fecha os olhos novamente encosta-se a ele. Gosta quando ele fica atrás dela, aquece-lhe o corpo. Fá-la sentir segura.

Ele olha para ela, ela acaba por fazer o mesmo. Ele vê os seus olhos, tão verdes, tão grandes, tão enigmáticos. Tentam dizer tantas coisas ao mesmo tempo. Sente os lábios dela. Toca-lhe no corpo, com as pontas dos dedos. Sente o relevo do peito, a barriga, o umbigo, sente as pernas, o pescoço macio. Ela fecha os olhos, parece gostar. Mexe-se, vira-se de costas e encaixa-se nele. Ele deixa, e aperta-a.

Ela pergunta se pode escrever sobre isto.

Ele olha-a com ternura, diz que sim. Diz que também irá escrever.



Retirado de O Ano de 2000 (11 de Maio de 2000)

sábado, 20 de fevereiro de 2010

she came suddenly and silently

Homem (apenas voz):
Eu gosto de me afastar, de nadar até ao ponto mais fundo da piscina e observar as pessoas que dividem este espaço comigo.
(pausa)
Reparo no quanto somos parecidos dentro de água, as toucas, os fatos de banho, a pele molhada. Acabamos por nos tornar seres de pele análoga com modelos e colorações delimitados que reflectem a nossa personalidade e gostos pessoais.
(pausa)
São tantas as coisas que nos passam ao lado.
(pausa)
Mas a piscina nem sempre está assim.

Depois da avaliação à piscina o narrador olha para o restante edifício. Vemos as paredes do edifício, uma de vidro e as restantes opacas. Vemos o tecto. Há luzes bastante violentas situadas nas paredes laterais da piscina. No lado esquerdo, está uma espécie de arrecadação com os colchões, bolas e barbatanas para uso dos frequentadores da piscina. O narrador olha para a parede de vidro do lado direito e vê-se reflectido nela.


Homem (apenas voz):
Estou demasiado cansado para parecer atractivo.



Vemos a pista 2. Um professor a gritar com a rapariga dos olhos castanhos. Ela baixa a cabeça para se certificar que o nosso narrador não ouvira aquela repreensão desastrosa. Ele reparara, mas não lhe interessa.

Vemos um relógio na parede, um pouco acima da cena do professor e da aluna. Um zoom leva-nos ao relógio. O tempo passa devagar, os ponteiros movimentam-se em câmara lenta. Faltava ainda vinte minutos de natação.

Vemos a cara do narrador, cansado, um pouco irritado e aborrecido por ainda faltar tanto tempo. Vemo-lo levantar a cara e olhar perplexamente para o bar por cima da piscina. O nosso ângulo muda e conseguimos ver o bar da mesma perspectiva que o narrador. Vemos a rapariga dos anos 20. Cabelos loiros, caracóis, pelos ombros. Olhos azuis, claros, bonitos. Lábios muito vermelhos, como habitualmente e uma roupa bastante formal. Branca e justa. Com um cinto preto pouco abaixo do peito. Vemos um excesso de iluminação na face, para lhe dar um ar mais genuíno. Ela olha-o misteriosamente. Vemos o actor parado, paralisado a olhar para ela, só se ouve a sua respiração a aumentar.

O narrador relaxa os músculos e deixa-se cair até ao fundo da piscina, fecha os olhos para a visualizar melhor, isso é nos dado a entender pelas expressões faciais. Empurra o chão com os pés para voltar ao de cima. Enquanto desce, a música vai-se tornando mais fraca e fraca até que se deixa de ouvir. Apenas se visualizam alguns traços do seu corpo, mas com uma iluminação negra. Como se as luzes da piscina se tivessem apagado. Logo depois de o fazer e voltar à superfície apercebe-se que as luzes estão apagadas. Nada ilumina a piscina interior com excepção da lua. Os professores desapareceram, os frequentadores também. A música parou.

Temos uma visão escura de toda a piscina, vemos algumas partes da cara do actor devido à luz da lua que passa através da parede de vidro. Começamos a ouvir um som, uma melodia como que vinda do interior de um búzio. Ouvimos o coração do narrador a bater. Vemo-lo em pânico, totalmente desconfortável. Depois ouvimos um silêncio repentino e vemos o narrador agarrado às divisórias das pistas a nadar até à zona mais baixa da mesma.
Homem:
Heyy! (grita)
Está aqui alguém?


O tempo passa devagar. Vemos o relógio, pouco iluminado pela lua. Vemos o narrador, com a respiração demasiado ofegante, agarrado às divisórias da piscina. Vemos os seus pés no fundo da água, vemo-lo hesitar em pô-los no solo. Vemo-lo avançar e ao nadar rapidamente com medo, bater com um pé na escada da piscina.

Homem:Arghhh.
Merda!

Ouve-se a voz do narrador ecoar e percebe-se que ele se ouvia a si próprio. Ouvimo-lo gritar e bater com as mãos na superfície água. Ouvimos um segundo som. Alguém entra na água. A música Secret Garden – Dave Holland Quartet toca. Não vemos o que entra, apenas ouvimos. Uma nova respiração. Mais calma, mais delicada. Um pequeno chapinhar na água. Ouvimos o narrador gelar de medo. A sua respiração corta-se totalmente e ouvimos o coração a bater mais e mais. Não fala, não respira.

Homem (apenas voz):
E depois… senti qualquer coisa a crescer nos meus calções…
(pausa)
E outra a tentar tirarmos.

 
Por "Narrador" em Lábios Vermelhos (Guião)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

HAPPY MONDAYS

-Patrícia! Patrícia! – acordo com o bater repetido e estrondoso na porta. Parece a Ana, parece chateada e nervosa. Isso normalmente traz-me dores de cabeça. – Patrícia caralho! Abre lá a porta. Temos de ir ter com o Johnny, lembraste? Eu avisei-te pá.


Olho para o relógio e vejo a quantidade exuberante de horas que dormi. Uma coisa assustadora. São duas da tarde e ainda nem almocei, sinto o estômago a desfalecer por causa do whisky, parece pesado e quente. Estou a suar por baixo deste fato de pele branca que uso diariamente, sei que pareço horrível e também sei que a Ana não me vai dar muito tempo para me despachar. Levanto-me a muito custo, sinto o corpo tão fraco e abro a porta devagar. Deixo-a entreaberta.

-Sim?

-Porra Patrícia, estavas a assustar-me. O que é que se passa?

-Nada. Estava a dormir.

-Txi, que bafo. Tiveste a beber outra vez?

-Não! – ela deita-me aquele olhar indignado que usa quando tem a certeza de uma coisa e sabe que a enganamos descaradamente. Estava sempre a fazê-lo com o Johnny.

-É, bebi qualquer coisa, Ru, bebi qualquer coisa.

-Oh Patrícia, pá. Vai-te vestir que temos de ir ter com o Johnny. – sinto-me feliz por passar livre disto. Quando a Ana se irrita a sério com alguma coisa chateia-me até à exaustão e, normalmente, eu sei que ela tem razão, de maneira que não a posso criticar. Debate-se perto da porta e vira-se para mim com um ar ameaçador e feliz. – Falamos disto depois.

Fecho a porta e suspiro pela minha má sorte. Acendo a luz e os meus olhos fecham-se num reflexo, magoados pela claridade. Saio do quarto e entro na casa de banho, tomo um duche de água fria e volto para o quarto onde visto um vestido justo e fresco. Volto para a sala e a Ana está sentada no sofá, a beber um sumo de frutos vermelhos que eu comprei para mim e que era antioxidante.

-Estou pronta. – digo com uma voz rouca e deprimida.

-Sim, sim. Vamos já.

-Porra, mas não disseste que já estávamos atrasadas?

-E estamos.

-E estamos? Eu estou pronta.

-Foda-se Patrícia. Come qualquer coisa, estou a acabar de ver isto na televisão.

Nem argumento. É o que eu digo, às vezes a tipa põe-se toda exaltadinha e eu é que tenho de me redimir. É assim. Se fosse com o Daddy a situação tornava-se mais feia.

-Ana?

-Fogo! O que é?

-Desculpa?

-O que é Patrícia? Estou a tentar ver a merda do programa.

-Ohhh… ainda há sumo desse?

-….

-Ana?

-Agora não.

-Ana?

-PORRA PATRÍCIA. AGORA NÃO. – estou decididamente ofendida e vou fazer os possíveis para o demonstrar. Ela não fala assim comigo. Bato com porta do frigorifico e ponho-me a lavar as mãos no lavatório, estou com uma intensa vontade de chorar, deve ter sido do whisky.

-Sim, o que é que querias à bocado? Estava a acabar de ver uma coisa na televisão. – não lhe vou responder. Esta idiota magoo-me. Já a avisei em relação ao mau temperamento dela. – Patrícia? Eu estava a acabar de ver o programa. O que é que me estavas a dizer?

-Já não interessa. Vamos embora.

-Mas diz lá.

-Não interessa.

-Oh pá… desculpa lá. Eu não queria gritar, mas estava concentrada naquilo e tu estavas só a chatear-me. O que é que querias, diz lá. – e nisto, estende-se e abraça-me. Pois, temos de admitir que ela tem um dom. É uma manipuladora como diz a minha avó.

-Bem… ainda há sumo desse?

-Não, eu bebi o resto.

-Mas o sumo era meu, caralho! – repelei-a com os braços.

-Teu? O sumo é nosso!

-Não! O sumo é meu… era!

-Desculpa? Tudo o que está nesta casa é partilhado. Inclusive a minha roupa. – O Daddy acabou de entrar e ficou a fitar-nos atentamente. – Isto é para ti também Daddy. – Ele olha confundido. – Porque é que eu tenho de aceitar que vocês usem as minhas roupas mas eu não posso beber a merda do teu sumo?

Ela tem razão. É o que eu digo, é uma manipuladora.

-Bem… podes. Tens razão, desculpa lá. Hoje não acordei a sentir-me muito bem.

-Vamos embora.

-Para onde é que vão? – pergunta o Daddy.

-Vamos a casa do Johnny. Logo trazemos-te qualquer coisa. Vai ao supermercado e compra vodka, que logo ficamos por cá.

-E whisky. – acrescento eu. Não curto muito vodka.

-Whisky? – pergunta ele.

-Sim, whisky.

-Porque whisky?

-Porque eu gosto. Não curto vodka.

-Tu curtes whisky, Ana? – ele fala monocórdica e suavemente. Ela olha intrigada.

-Sim.

-Eu também curto whisky… - conclui ele.

-Compra Jack ou então Johnny Black.

-Jack?

-Jack Daniels.

-Curtes Jack Daniels, Ana?

-Mas o que é que isso interessa? – digo eu. Já me estou a irritar com a anormalidade deste tipo. Ele deita-me um olhar zangado e critico.

-Sim, curto. Vá Daddy, compra isso. Até logo. Faz qualquer coisa para o jantar. Anda Patrícia. Ah, olha… vou levar o teu carro, ok?

Antes de sair deito-lhe um olhar mortífero. Não tenho paciência para as cenas dele. É que gosta mesmo de chatear as pessoas. Entramos dentro do carro do Daddy, vai a Ana a conduzir, eu vou ao lado. Abro o porta luvas e procuro o objecto do meu desejo. Ah, Gordon’s, uma garrafa cheia.

-Para que é isso? – pergunta a Ana, prestes a criticar o meu mau hábito de beber.

-Para levarmos para casa do Johnny. Sabes bem que temos de amansar o tipo. Se lá aparecermos de mãos a abanar ele não vai achar nada simpático e é bem capaz de o dizer.

-Sim, sim. Tens razão. Levamos isso. Depois compramos outra para o Daddy.

Ponho o Peel Sessions dos Joy Division e durante a viagem de carro vamos a acompanhar a voz do Ian na música Shes Lost Control.



She said I've lost control again.
And she screamed out kicking on her side and said,
I've lost control again.
And seized up on the floor, I thought she'd die.
She said I've lost control.
She's lost control again.
She's lost control.
She's lost control again.
She's lost control.


Por Patrícia em Nevermind (Cap. Na narina direita...) 2008

Little tongues, black tongues, gold and dauby tongues

Acordo num quarto falazmente escuro. No meu quarto. A Nancy dorme ao meu lado, desfalecida. Perdida num sonho de coca. Nancyyyy. Salto para o chão e sinto os meus pés flutuar, em oposto ao peso exagerado do meu corpo, que se apresenta como um verdadeiro empecilho aos movimentos mais ligeiros. Procuro a máquina. Ajusto a lente, conformo a luz e fotografo-a em vários ângulos criando – quase - ilusórios panoramas. Acendo um cigarro e vou descalça até à sala de revelações. Filtros vermelhos, delicioso. Revelo as fotografias e sinto-me tentada a voltar para o quarto e a possui-la uma vez mais, ao ver o seu corpo mutilado e ensanguentado, exausto, em cima daqueles lençóis sujos. As fotografias assemelham-se demasiado com as outras peças que possuo. A Nancy apesar de tudo não contém nada de incrível. Aborrecida. Torna-se aborrecida.


Vou até à cozinha, seguida pelos sons riscados das lâmpadas fracas que piscam continuamente. A luz é tão fraca que acaba por se tornar corriqueira e dá à minha cozinha descuidada um aspecto underground. A carne estragada no lava-louças emana um cheiro incrivelmente decomposto. Aproximo-me e noto a escuridão que esta foi adquirindo. Controlo o estômago mas um jacto de vómito atinge a carne em cheio e o cheiro torna-se duplamente intenso. Arrasto os pés até ao quarto e espero adormecer novamente. Mas o meu corpo entra em suores e convulsões indesejáveis e vejo-me a acordar repetidamente pela noite. Recordo, dos curtos momentos acordada, leves memórias fortes e incomuns dos sonhos por onde viajei e incomoda-me a nitidez de um deles em especial. E eu acordo, uma vez mais. Os cabelos emaranhados, o corpo suado e as dores internas dos órgãos a desfazerem-se. E a imagem distorcida desta rapariga de longos cabelos loiros e pele branca, o modo imbecil com que aparece retratada nos meus sonhos, a decência dos seus movimentos, a imaculabilidade dos cenários em que é inserida, o seu aspecto. E nunca me consigo recordar do seu nome, do nome que ela profere vezes seguidas, continuamente. O seu nome…. O mutante que vive aprisionado com a sua doença – algo que não o deixa, que progride, se desenvolve, cresce, germina. Na cabeça, pelas veias, nas zonas mais deformadas do seu corpo. E a mulher do mutante vai à casa de banho, abre as pernas e do sexo caem-lhe rosas, vísceras e órgãos. Depois o corpo incendeia-se e em plena combustão ela esquece-se de onde pertence, enquanto sente o corpo prospender de si mesmo.

Por Alicia em As duas invenções do pornógrafo Loy

I feel bored, life is boring, man is an unsatisfied being

Recentemente vi-me sozinho num quarto, num espaço fechado que não havia penetrado antes. O cheiro que nele perdurava, as tonalidades que nele eram pintadas, a forma irregular dos espaços. Deixei-me ficar e não precisei de cocaína nessa noite. A harmonia por si só estava dispersa no ar. De manhã cedo, ao romper do sol olhei em volta e apercebi-me que se tratava do meu quarto impecavelmente limpo e arrumado. A minha mãe chegara de viagem e mandara limpar toda a casa, inclusive o meu quarto. Não suportei a luz do sol e o cheiro novo e familiar que voltava a entrar e, portanto, fiz duas linhas grossas e cheirei-as. O cheiro parecia não se extinguir. Abri uma das reservas de Jim Bean e bebi um quarto da garrafa de uma vez. Liguei o estéreo no máximo e pus a tocar a Heroin dos Velvet Underground. O quarto pareceu incrivelmente brilhante e lúcido. Os cheiros, as formas habituais evaporaram-se pela porta encostada. Pousei a nuca na almofada e deixei os olhos fecharem-se progressivamente. O whisky e a cocaína fluíam e espalhavam-se dentro de mim, tão docemente, tão dominantemente. E adormeci, naquilo que deixou de me parecer o meu quarto. E dormi tão bem, Leigh, dormi tão bem.


Por Simon para Leigh em Empty Divisions

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Dóceis Criaturas serão sempre dóceis criaturas

-Gostas de ler, é? – diz um tipo, já nos seus cinquenta e tal, com um ar completamente nojento, que observa a Ana. O modo como o disse foi desprezível. Olho para trás para ver a cena melhor, embora as imagens me pareçam meio distorcidas. Ela nem tirou o nariz do livro e mantém um ar estático e sério.


-Sim? Sim? Gostas de ler? – e desata a rir maniacamente acompanhado por um outro velho, igualmente asqueroso. Ela lambe a ponta do dedo calmamente e dobra a extremidade da página, serena. Fecha o livro e coloca-o em cima da mesa sem tirar a expressão séria e zangada da cara. Continua a franzir as sobrancelhas o que foi mais que suficiente para os tipos perceberam que, agora, era tarde de mais para arrependimentos. Ela pega na cerveja alta e bebe-a de seguida, rapidíssimo. É a primeira vez que a vejo fazer isto, principalmente porque sei que não gosta de cerveja. Assim que engole, bate com o copo estrondosamente na mesa. Fita-o.

-Mas é o quê caralho! – grita ela. - Tou a falar contigo ó badamerdas!!

O gajo encolhe-se e tira aquele ar de gozo da cara. Ela está a fazer um ar de maluca do caraças. Os barmans param todos e olham para ela. O Fritz e o amigo dele viram-se para trás e até o Darwin lá fora olha para dentro. Só a Nipple e a Anita é que olham para a cena e se desmancharam a rir que nem umas malucas. A Ana levanta-se espalhafatosamente e empurra a cadeira nesse movimento impressionista.

-Puta que te pariu. – e revira os olhos – Estou mesmo a ver que hoje não saio daqui sem haver merda, foda-se.

-Epá, tem lá calma. – diz o gajo, já meio assustado. Há tipas malucas nos bares.

-É O QUÊ? É O QUÊ? – diz ela, expressando pura raiva.

-Epá nada! – diz ele e encolhe-se.

-HUM? HUM? É confusão? É confusão, caralho? – bem… pela cara dele dá para perceber que se está a cagar de medo. Está sério como tudo e começa a andar para trás, mais numa de fugir do que na defensiva. Ela faz uns movimentos bruscos. As pessoas olham todas para ela. Está tudo com uma cara de espanto e certo receio. Estão todos a procurar um motivo para bater no velho.

-Porra! Foda-se! – e nisto, atira-se para a cadeira perdida em risos. – Patrícia! Patrícia! Vem cá ver isto, pá! Anda cá rápido!!!

Olhei para ela e vi como se divertia com a própria representação, que tenho de afirmar que foi excelente, nem eu fazia melhor que aquilo. Viro as costas para o cenário e peço uma bebida. Quero fingir que não a conheço por uns minutos. As pessoas lá fora vão voltando aos seus estados normais e retomam as conversas antes iniciadas. O Darwin entra e parece preocupado com a Ana.

 
Patricia em Nevermind (Dóceis Criaturas-cap.8) 2008

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

The only things she sees - details, small things

Acto 13
A cena abre com uma máquina de filmar antiga, daquelas que são carregadas ao ombro. Quem segura essa máquina é a realizadora, filma Mia. Mia está sentada no chão, com os joelhos ao nível do peito e fuma um cigarro. O fumo sai e espalha-se em círculos no quarto. De um momento para o outro há uma inversão e quem filma é Mia. Filma a realizadora que está deitada a um canto do quarto, completamente nua, com o braço esticado acima da cabeça. Parece morta. Parece incrivelmente bonita. Desta vez o oposto sucede. A realizadora é filmada. A que sabe isso?

A cena fecha. Fica tudo negro.

Volta a abrir com a festa da sala. Estão todos a falar uns com os outros. Há fumo e bebidas. Há mulheres com vestidos coloridos e curtos a dançar. Por cima da cabeça de todas as pessoas formam-se bolhas de ar, círculos perfeitos e de diferentes dimensões. É difícil defini-los. Esses círculos misturam-se uns com os outros e fundem-se, como pedaços de gelatina flutuantes.


Mia: Os círculos de fumo são como os círculos da vida. São círculos místicos. São algo mais do que aparentam ser. São uma dimensão, uma ideia, um universo. Emergem de um cigarro para o ar, espalhando-se em esbatidos fios de fumo. Advêm de um cigarro para o outro, para o ar. Os meus dedos atravessam-nos, fundem-nos, mergulham neles. Esses círculos de fumo, círculos místicos que pairam no ar como leves partículas de pó, como plaquetas de oxigénio que se fundem invisivelmente


Por Ann Wallace sobre Mia em Empty Divisions

The moon pulled me up

-Costumava ler os teus livros Paul, eras fantástico.
-Hu-Hu.
-Que se passou contigo? Costumavas ser um excelente escritor...
-Foi... O cheiro, o seu aspecto.
-O cheiro do quê? O aspecto do quê, Paul?
-Dela...
-A tua mulher?
-A minha mulher não é graciosa.
-Não estou certa de te conseguir acompanhar nesse pensamento, Paul.

Olha para mim sedutoramente. Sorri-lhe. Não há visão mais bonita que esta. Deslumbrante. A lua.

Por Paul Hudson em Jack Daniels

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Drugs, Candies and high hallucinations

Sinto tremores e suores pelo corpo, o meu robe de veludo azul está preso a mim, entranhado na carne, através do suor. Vou até ao bar e sirvo-me com um scotch puro que me queima os lábios. No entanto o gosto do whisky é ténue quando comparado ao sabor doce da coca e à moca forte da heroína. E eu sinto a falta delas. Mais suspiros, mais delírios, mais suores. Limpo a testa à manga do robe e sinto-a derreter, a carne empapada a escorrer-me pelos cantos da cara, deslizando junto às orelhas e caindo-me no peito, com uma força vagarosa e abalizada. Os restos de pele pendem-me na testa, a caírem e a taparem-me os olhos, que por sua vez são ferozmente ressequidos pelas luzes fortes projectadas no meu jardim perdido. SENHORES E SENHORAS, ouço-me gritar, como se estivesse fora do meu corpo, hoje o jardim perdido do senhor Loy é exclusivamente vosso. Aplausos, aplausos. E o pano de veludo negro cai. O meu jardim fica envolto numa idealização escura, numa imagem passada. Volto ao bar e sirvo outro scotch, desta vez faço um duplo. Bebo-o de um trago. Os meus lábios rasgam, abrindo-se neles pequenas e dolorosas fendas. No entanto continua sem se assemelhar à moca da heroína. Evito o inevitável. Pego no comando e ligo o projector da sala, imediatamente, esta fica reflectida pelas imagens dos meus filmes, por broches, por quecas, por enrabanços, por esporra, por conas e nádegas. Todas sobrepostas umas às outras.

Por Loy em As duas invenções do Pornógrafo Loy