-Gostas de ler, é? – diz um tipo, já nos seus cinquenta e tal, com um ar completamente nojento, que observa a Ana. O modo como o disse foi desprezível. Olho para trás para ver a cena melhor, embora as imagens me pareçam meio distorcidas. Ela nem tirou o nariz do livro e mantém um ar estático e sério.
-Sim? Sim? Gostas de ler? – e desata a rir maniacamente acompanhado por um outro velho, igualmente asqueroso. Ela lambe a ponta do dedo calmamente e dobra a extremidade da página, serena. Fecha o livro e coloca-o em cima da mesa sem tirar a expressão séria e zangada da cara. Continua a franzir as sobrancelhas o que foi mais que suficiente para os tipos perceberam que, agora, era tarde de mais para arrependimentos. Ela pega na cerveja alta e bebe-a de seguida, rapidíssimo. É a primeira vez que a vejo fazer isto, principalmente porque sei que não gosta de cerveja. Assim que engole, bate com o copo estrondosamente na mesa. Fita-o.
-Mas é o quê caralho! – grita ela. - Tou a falar contigo ó badamerdas!!
O gajo encolhe-se e tira aquele ar de gozo da cara. Ela está a fazer um ar de maluca do caraças. Os barmans param todos e olham para ela. O Fritz e o amigo dele viram-se para trás e até o Darwin lá fora olha para dentro. Só a Nipple e a Anita é que olham para a cena e se desmancharam a rir que nem umas malucas. A Ana levanta-se espalhafatosamente e empurra a cadeira nesse movimento impressionista.
-Puta que te pariu. – e revira os olhos – Estou mesmo a ver que hoje não saio daqui sem haver merda, foda-se.
-Epá, tem lá calma. – diz o gajo, já meio assustado. Há tipas malucas nos bares.
-É O QUÊ? É O QUÊ? – diz ela, expressando pura raiva.
-Epá nada! – diz ele e encolhe-se.
-HUM? HUM? É confusão? É confusão, caralho? – bem… pela cara dele dá para perceber que se está a cagar de medo. Está sério como tudo e começa a andar para trás, mais numa de fugir do que na defensiva. Ela faz uns movimentos bruscos. As pessoas olham todas para ela. Está tudo com uma cara de espanto e certo receio. Estão todos a procurar um motivo para bater no velho.
-Porra! Foda-se! – e nisto, atira-se para a cadeira perdida em risos. – Patrícia! Patrícia! Vem cá ver isto, pá! Anda cá rápido!!!
Olhei para ela e vi como se divertia com a própria representação, que tenho de afirmar que foi excelente, nem eu fazia melhor que aquilo. Viro as costas para o cenário e peço uma bebida. Quero fingir que não a conheço por uns minutos. As pessoas lá fora vão voltando aos seus estados normais e retomam as conversas antes iniciadas. O Darwin entra e parece preocupado com a Ana.
Patricia em Nevermind (Dóceis Criaturas-cap.8) 2008
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