You have to ask yourself what brought the person to this point

domingo, 2 de fevereiro de 2014

só a falar de café.

Cheirou-lhe a café e olhou para a cozinha, mas não estava lá ninguém, a sua mente começara a fabricar o odor em devaneio. Olhou em redor e substituiu os ares da casa pelos de há uns anos atrás, transportou-se para uma noite, quatro anos antes, e viu Jane regressar com duas chávenas quentes na mão.
-Era mesmo disto que estava a precisar. – disse ele.
-Se continuas a beber café dessa forma, vou ter de me apaixonar por ti.
-Apaixonas-te sempre por homens que bebem muito café?
-Primeiro provas, depois provas novamente, depois ficas louca.
-Sabe-te sempre ao mesmo?
-É café, mas não sabe sempre ao mesmo.
-E os cigarros?
-Só tornam a vida mais interessante. Sem cigarros, isto era tudo cinzento.
-E quando deixarmos de fumar?
-Vamos arranjar outra coisa qualquer para levar com as culpas.
-Acho-te muito sábia para uma rapariga.
-Sou uma pessoa sensata. E percebo as coisas.
-As coisas?
-As coisas todas. O teu café é especial e mais não te posso dizer.
-Não gosto de ficar a pensar demasiado nas coisas.
-Porque ficarias? Estamos só a falar de café.
James riu-se, olhou-a uma vez, voltou a olhar para ela e depois corou.
-Tens que aprender a ser subtil.
-Eu já sou subtil.
-Isso é o que tu achas. Não há descrição em ti, leio-te as intenções todas.
Ele recostou-se no sofá e ficou a observá-la, era misticamente bela.
-Chateia-te?
-De forma nenhuma. Até acho querido, quereres dizer e não dizeres.
-Mas não dirás isso para sempre.
-Conto que não o farás para sempre.
-Talvez não. Mas talvez fizesse. E então? Deixaria de ser querido?
-Passaria a ser um problema.
-Talvez passasse. Como lidas com problemas dessa natureza?
Jane recostou-se no sofá, levou a chávena à boca e, em seguida, deu um bafo no cigarro. Expirou o fumo e disse:
-Normalmente recosto-me, bebo um café e fumo um cigarro.
-E o problema?
Jane agitou a mão no ar, apontando para ele:
-Esparramado assim à minha frente.
-Que problema tonto.
-Como a maioria deles todos.
-Acho que tens razão, mas devo advertir-te: eu sou um homem problemático. Caótico.
Jane olhou para o ar e encostou a mão à cabeça, parecia absorta nalgo mágico.
-As pessoas arranjam medos esquisitos.
-Acho que arranjam. Uma vez conheci uma pessoa que tinha medo de barrigas.
-Isso não é nada! Uma vez conheci uma pessoa que tinha medo dela própria.
-Isso é terrível.
-É, não é?
-Como é que se salvou?

-Ainda é cedo para dizer. Daqui a uns anos conversamos sobre isto.

Inércia, 2014

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