O meu cigarro queima-me os dedos. Apago-o num dos muitos cinzeiros espalhados pela casa. Volto ao quarto para buscar os rolos da máquina e dirijo-me para a sala de revelação. É totalmente vermelha. Por vezes gosto de propender por lá, durante horas e pensar nas minhas fotografias, em fluxos vermelhos. Molho as fotografias nos produtos químicos, amplio-as e espero que sequem. Progressivamente vou começando a distinguir as formas de Dana e Joanna. As suas expressões de prazer. Deixo as fotografias secar. Volto para o quarto. O caminho até lá é silencioso. O som seco das minhas botas contra o chão preenche o ar e o escuro da casa. Purcell continua a tocar. Do canal 3 em directo observo ao que chamam sombras de amantes, reflexos, imagens nítidas e explícitas. Coloco-me a meio do quarto, de modo a conseguir observar através da janela e através do ecrã. A mesma imagem dos dois ângulos. E de repente assemelha-se tudo a um dos meus filmes, das minhas obras de arte. A escuridão envolvida com os neóns azuis e negros do quarto, a imensidão dessa escuridão que o envolve, o erotismo que se praga pelo ar. É lascivo, completamente. E todas estas pessoas estão lá, no meu quarto, comigo, envoltas em mim, a beijarem-me, a absorverem-me, a devorarem-me bastante vagarosamente, a consumirem-me. E sinto o meu ser abandonar-me, perder-se, flutuar em mim. E todas essas pessoas, que me consomem…
por Alicia em As duas invenções do pornógrafo Loy
Sem comentários:
Enviar um comentário