You have to ask yourself what brought the person to this point

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

sem hostilidades geográficas

Caminham delicadamente, já noutro local mais sóbrio e diáfano que o anterior onde a recordação se prende no devorar de um fruto vermelho que lhe salpica a boca de um sabor melífluo e suprimido, os pés de uma felina incessável que se agita através de uma deliberação irreal à rendição e ao aprazimento.
A rua húmida e cálida denota um cheiro a alcatrão molhado que sensualmente vai devorando os indivíduos que nela se inserem como pequenas peças num tabuleiro onde o jogo é ilimitado.
Spike Hill avista-se a vários passos que os distanciam  mas que são rapidamente encurtados por passadas seguras e precisas, num girar de ancas muito ligeiro e sugestivo. Empurra com a mão pequena a porta de madeira alta e penetra um espaço frenético de batuques e melodias que se frisam no ar rasgado do estabelecimento em frequências altas e disformes de jazz e blues quase seriamente experimentais. O ambiente é pesado e intenso. O casaco comprido que lhe reveste as curvas delineadas é puxado por um braço vigoroso e forte de um homem de barba já branca que lhe segreda ao ouvido num sussurro lânguido:
-Ivy… - mas ela abre a boca num boleado perfeito de enlevo e segue indistinta até ao balcão, despersonalizando-se enquanto caminha num trajecto seguida de néones vermelhos que facultam o panorama underground de Spike Hill. As pernas entrelaçam-se num sentar certo e quase autónomo e o veludo macio das cuecas sente-se no entre pernas que vinca dois músculos firmes suspensos pela pressão desmedida.
O olhar do homem é insistente e atravessa o compartimento ainda que as costas voluptuosas o ignorem, mas comunicam numa ignorância tão quimérica e extraordinariamente rude.
-Ivy… - corta novamente e ela volta-se, com dois cubos de gelo frios entre a língua, desbotados pelo vermelho berrante dos lábios que se vai aniquilando. Não que não o sinta porque os corpos cansados dos dois roçam-se sob as luzes encarnadas e sobre o fumo embaçado daquele edifício complicado. Arqueia as costas perigosamente e ele aproxima as mãos só ate sentir o calor que emanam tão impetuosamente e que se dissipa num odor denso mas deliciosamente doce.
-Ivy… - ressoa novamente e ambos engolem os quarenta e oito graus de álcool cujo efeito veloz é patente logo após esse primeiro gole de muitos outros já tomados. A voz ondula e reproduz-se no ar, anexando-se às frequências improvisadas do sax e da bateria e do trompete mas é o som infalível do piano que se distingue. Já não é o homem que a nomeia, já não é a música que toca, já nem é, sequer, o whisky que se bebe. Cruzam-se várias parcelas essenciais mas só se distingue uma…Ivy.


Um exercício em Williamsburg.

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