Adormeço algures durante a tarde e desperto em meados da noite, com o toque quente de duas mãos duras. Não sabendo a quem pertencem deixo que me envolvam em dois braços esguios e também eles duros e cheiro um perfume que me recorda dois corpos em simultâneo. Um odor.
-Steve…
-Psiuu. – diz, tapando-me os lábios com a palma dos dedos molhados. – Estou tão bêbado baby.
-Como é que entraste aqui?
-Ó… – ri-se – como é que entro sempre? Hum? – despe-me as cuecas e procura os meus pelos púbicos de modo a que os enrole entre os dedos como frequentemente faz – como é que entro sempre? Como é que faço sempre? Hum? Hum?
-Pára. – digo, afastando-o do meu corpo.
-Oh, vá lá, primeiro queres sair da minha casa sem te despedires de mim e agora recusas passar a noite comigo? O que é que se passa contigo, miúda?
-Estou cansada, Steve.
-Cansada não é a desculpa. Não pode ser a desculpa.
-Porquê? Porque é que não pode?
-Porque – diz, suspirando e parecendo incompreensivelmente cansado também – ainda não chegou a altura de te cansares. Há muito mais que isso. Tem de haver. – e durante o silêncio que se segue procuro o olhar perdido dos seus olhos cinzentos. A tonalidade. O odor. Há um negro impenetrável que reveste todo o quarto. É demasiado tarde para responder pois o seu corpo já tombado em cima do meu encontra-se envolto em soluços ferozes e desarvorados, comandados pela tristeza e pelo vazio e pela ausência. Abordada de surpresa permaneço imóvel enquanto ele se contorce em cima de mim a chorar e pressiono os braços sob a sua nuca, empurrando a sua face de encontro ao meu peito quente chorando também em silêncio. Adormecemos.
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Conto 3: Jameson Irish Whiskey, História de uma Garrafa de Whisky
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