Custara-lhe mais do que teria considerado conciliar o acto de tolerar com o acto de enlouquecer completamente. Custava-lhe aguentar as estribeiras, era confessável, mas rapidamente aprendeu a fazê-lo e ao fim de algum tempo proporcionava-lhe uma enorme satisfação observar o quanto as situações se haviam alterado, invertido até.
Susan já não chorava, nem no caminho para a escola, nem no regresso a casa e, muito menos, no corredor que dava acesso à garagem. Ao invés disso sorria. A vida parecia agora tão meramente…suportável. “Gosto de te ver assim, olho azul, as coisas começam a correr bem, as miúdas precisam de sentir que te aguentas, que consegues lidar com as coisas. Como é que esperamos que elas lidem com os problemas da vida se não somos fortes o suficiente para lidarmos com eles? Somos o modelo a seguir, temos de transmitir uma imagem de estabilidade.” E o resto Susan deixara de ouvir. Sorrira e dissera-lhe que compreendia tudo isso, que de começo custara de facto mas que agora as coisas eram todas mais fáceis. Nunca nenhum deles soube certamente porquê, porque é que as coisas eram agora mais fáceis mas a verdade é que as garrafas de Johnny Walker continuavam a desaparecer do bar, bebidas numa insaciável cede que aniquilava os advertências todas do que era a sua vida de resigno.
Durante a noite, continuava a seguir a filha numa vigia de puro deleite e adoração pelo que esta fazia; de fascínio. E foram variadas as ocasiões em que se viu durante o dia-a-dia a observar a filha com esses olhos de mãe apaixonada, de mãe orgulhosa. “O que é?”, dizia-lhe Teri, incomodada com o olhar patético da mãe, quase inebriado por essa paixão platónica. “Nada. Já não te posso observar?”, respondia Susan, de modo a abafar o assunto. “Poder podes mas parece que estás apaixonada por mim.”, replicava Teri, “E estou. Estou muito apaixonada pela minha filha”, dizia seguramente Susan, que em tudo tencionava verbalizar exactamente o que afirmara. A única diferença é que não estava apaixonada pela filha, mas sim pelas oportunidades que esta lhe proporcionara. Pelas ínfimas possibilidades. Pela alternativa à rendição auto-comiseradora. Havia muito mais que isso. Ela precisava de muito mais que isso. E agora condição com convicção, falava com convicção, dirigia com convicção, fazia amor com convicção. Dedicava-se ao mais ínfimo detalhe da sua existência com tamanha convicção, com tamanha dedicação, com fé. Para depois durante a noite se poder entregar ao seu devaneio predilecto, para beber até as coisas parecerem inexistentes. Era a bebida analgésica. Era a promessa. O desbobinar. O sabor quente que lhe lembrava as coisas que faltavam na terra, na vida, na casa, nos traços de carácter da sua própria pessoa. O whisky era tudo. Era quente. A filha era um mundo. Uma ilusão. Um capricho. O amante era perfeito. Era mundano e perfeito. Conto 2: Johny Walker, História de uma Garrafa de Whisky