You have to ask yourself what brought the person to this point

domingo, 8 de setembro de 2013

falas demasiado.

-Falas demasiado, desculpa. – profere e ri-se do seu olhar esgazeado. – Sally?
-Sim – responde-lhe esta.
-Já não sei qual delas devo ser, qual devo representar neste momento.
-Estás muito cansada…e se te deitasses?
-A minha alma está cansada de tanto dormir.
-A tua alma está cansada desse gin.
-Este gin… - Crystal agita o copo entre os dedos, procura uma azeitona e com os dois dedos temulentos coloca-a entre os dentes –É só um copo de gin, preciso disto para trabalhar.
-Não precisas verdadeiramente de nada. As pessoas iludem-se com necessidades.
-Respondes-me a uma questão, Sally?
A outra assente.
-Qual delas devo ser? … Porque te ris?
As gargalhadas de Sally são maléficas e ressoam diabolicamente pelo quarto.
-Porque te ris? É de mim? Estou muito cansada, Sally, o meu ser está cansado desta adulteração de personalidade sempre tão sujeita à mudança. Mas porque te ris? Deixa-me servir mais um e podemos rir juntas… mais uma vez.
Crystal encontra Sally na solidão do dia onde a sobredosagem da sua pessoa e um vinil gasto de jazz lhe preenchem a alma. Já é muito tarde do dia seguinte à noite e nem pequeno-almoço tinha tomado. Limita-se a preparar algumas bebidas, feitas sem qualquer rigor, as quantidades de álcool incertas, e num sorriso derrotado devora-as. Vê o contorno jovem das suas linhas e deseja ser muita velha e perceber mais coisas da vida. Sabe que com o tempo vem uma grande maturidade emocional e sente em todo o seu corpo a necessidade de que esse amadurecimento ocorra rapidamente. O colapso emocional que está a sofrer vai para além de qualquer coisa que jamais experimentara. Sente-se como se os seus pensamentos tivessem sido violados, a magnitude e a tristeza dos seus olhos é imensurável e, numa pose fixa, observa a sua silhueta no espelho e comove-se com o sofrimento que se lê nos seus olhos.
-Nós não controlamos isto, é isto que nos controla a nós.
-Isto o quê, Crystal?
-A criação! O que haveria de ser. Não somos nós que controlamos a criação, é a criação que nos controla a nós. Entende bem a estupidez deste diálogo. Já estás tão entranhada que não preciso de te dizer isto.
-Crystal…
-O que é Sally? Não controlamos a vida, a vida é que nos controla a nós.
-Vais dizer-me que não gostas nem um bocadinho que aquele homem tenha medo de ti?
-Que queres dizer?
-Que isso quer dizer qualquer coisa, não quer?
-Talvez…Sim…acho que quer.
-Quer dizer demasiado.

-Já és uma personagem muito completa.

O Pijama da Gata